quarta-feira, 6 de abril de 2011

O Imortal Kalymor: DEUS, POR MALBERON. INTERLÚDIOS, PARTE 12

_Quem é Deus?

Ouço o padre se mover para trás. Uma respiração breve e profunda, seguida de um gesto de firmar os ombros, como se esperasse uma agressão. Paro um instante, o mínimo que posso fazer. A pergunta foi pequena, mas ressoou como mil trompetes em um quarto apertado. Quase tenso, o padre aguarda que eu continue, num misto de temeridade e curiosidade, sendo esta última indigna de habitar sua consciência, tendo em vista a responsabilidade que carrega. Porém, sinto, no som da madeira do confessionário, que responde aos seus movimentos grosseiros e entrega sua inquietude, que o conflito é maior. Pois mesmo ele, um padre, com todas suas certezas, antes de tudo é uma pessoa comum, com todos seus questionamentos. Uma alma inferior, dividida na tarefa de parecer superior.
O instante passou ligeiro. Mesmo que não tenha jamais sido tempo suficiente.

_Pergunta-me isso, _disse, então, o vampiro _mas sabe até onde deseja compreender? Posso lhe explicar o “tudo”, mas, se o fizer, que sentido terá o restante?

_Caso eu fosse uma pessoa comum, um humano, com a mesma sabedoria que tenho hoje, desejaria não ter esse conhecimento, pois nada em minha vida importaria depois desta noite, nem todos os outros momentos antes dela. Mas sou diferente, não me limito a um futuro, ou a um plano, ou a um propósito. Meu estado amorfo permite fazer tal pergunta e obter a resposta. E também você permite, Malberon. Seu convite...

_Então, vamos a ela! A compreensão da fórmula. Ao entendimento do universo. _E começou, sem mais delongas, ou suspense, ou qualquer tipo de preparação, como se algo nele o incentivasse a passar tal conhecimento. _Aquilo que chamam de Deus é um ponto em comum. Um equilíbrio. Um pêndulo que oscila de um lado para o outro. O universo poderia ser chamado de Deus. E já que esta fórmula une todas as forças, o “U”, então, poderia ser Deus. Mas, se aceitarmos isso, negaríamos a pergunta: “E quem criou o universo?” O problema é que aceitamos a existência de Deus como sem origem, como uma criatura onipotente que sempre existiu. Mas, se este “U” é “Ele”, então o universo não poderia sempre ter existido? Não poderia ser sem origem?

_Então, devo lhe perguntar o que é o universo?

_Talvez! Mas assim você já teria aceitado o que eu lhe disse. Definimos o universo como o “tudo”. Mas tudo o quê?

_As galáxias, os planetas, as estrelas...

_Não! Assim o “tudo” seria somente uma parte do... “tudo”. Apenas a matéria, o sólido, o que você pode conceber. Assim, o universo seria um espaço onde as coisas se encaixariam. Lugares com distâncias calculáveis. Se isso for “tudo”, então, logicamente, é só isso que existe. Como, então, explicaria a sua existência? A sua permanência aqui? Deve compreender a situação de sua alma, a condição atual de sua amada e, também, o seu poder de necromante, de convocar forças que não são daqui. De onde provêm? De um planeta, de um lugar distante, de outra galáxia? Certamente que não. Concluímos, dessa maneira, que o universo é “tudo”. E que o “tudo” é muito mais do que tocamos.

_Então, o universo é imensamente grande!

_Eu diria que, de tão grande que é, torna-se infinitamente pequeno. Desta forma, Deus é a coisa mais minúscula que você pode imaginar. Ele é o universo, mas isso se divide em incontáveis planos de existência. No espaço, temos os astros, as constelações e este planeta. Em outros planos, temos realidades alternativas, momentos que não existiram aqui porque algum ato, ou não ato seu, não permitiram. Em algum lugar, por exemplo, este instante estaria acontecendo de outro modo, caso você não tivesse seguido o jovem vampiro até aqui. Caso você tivesse matado Ismael. Caso Winslet jamais tivesse visitado sua tribo. Em algum plano, Marina brinca ao lado de anjos luminosos. Em algum plano, ela já voltou. Em outro, talvez, já tenha partido novamente. Isto é Deus, todas as infinitas existências, ocorridas ou não, ou ocorridas em outro lugar. O universo inteiro de possibilidades. E, ainda assim, afirmo que Ele é pequeno. Repito que é um ponto em comum. Porque tudo isso tem que ser interligado de alguma forma. Pois, se Ele é “tudo”, não pode ser fragmentado, para que essas possibilidades existam separadamente. Eis, então, o erro de pensamento dos homens. Um Deus grande, imenso. O equívoco máximo. Pois O procuram no extremo completamente oposto. Este plano contém os planetas, entre eles a Terra, nela o vento, a água, a natureza, a vida. Numa escala decrescente das coisas, chegamos, inevitavelmente, ao átomo. Antes, acreditava-se ser ele a matéria comum a todo o resto. Hoje, até mesmo ele foi dividido e, no futuro, será ainda mais dividido e decifrado, até um ponto onde não mais haverá ramificações.

_Entendo o erro! O “tudo”, o conjunto da existência é formado da união de partículas diminutas. Deus, então, não é o máximo, mas o mínimo que podemos conceber.  E que ponto é esse onde as ramificações terminam?

_O “mana”! _Afirmou o vampiro.

_A energia que utilizamos em nossas magias? _Indaguei!


CONTINUA.....

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