quarta-feira, 3 de agosto de 2011

O ARTESÃO- Interlúdios, parte 4

O homem emudece. Fica ainda mais assustado pelo fato de ter visto Malberon e saber, agora, quem ele era. Instantes depois, ele retoma nossa conversa, querendo, talvez, saber um pouco mais de sua atual situação:

_Você quem fez os outros pilares?

_Sim, muito anos atrás.

_Ele disse que você viria, mas sua tarefa era outra.

Ouço passos no início do corredor. O rapaz de terno entra, trazendo um note book e uma pequena cadeira. Levanto-me e viro para ele, deixando o homem sentado no chão. O rapaz, então, dirige-me a palavra:

_Não deveria falar tanto ao nosso respeito!

_Não há nada a temer. Ele vai estar morto ao final disto!

O homem no chão ouve o que eu falo. Pega lentamente seu material e, trêmulo, recomeça de onde havia parado.
O rapaz de terno senta na cadeira, abre o note book, apoiando-o nas pernas. Olho para as cúpulas, e percebo minha tarefa.

_Malberon deseja que eu faça o registro? O catálogo desta nova espécie? Mas qual espécie seria?
Devo analisar, então, se deixei algum erro. Alguma falha, algum registro pendente. Eu era o responsável por tudo isso, desde os pilares, as cúpulas, a conservação dos corpos das espécies, suas história, suas línguas. Mas, se ele pediu pra que alguém mais fizesse isso, deve ser porque tem alguma pressa. E quando nós imortais temos pressa de algo, é porque este algo é muito importante.

_Faça os registros no computador. _Digo ao rapaz. _Mas, preciso conferir o registro dos livros.

O rapaz se levanta e vai para um outro cômodo. Instantes depois, retorna, com um livro antigo. Eu o escrevi, séculos atrás. Um registro completo do que tem neste corredor. E, isso significa, um registro completo de diversos seres que habitaram diversas eras do mundo.
Não sei por que vou conferir o que fiz. Um grande poder dos imortais é a capacidade de não esquecer nada. Sei exatamente tudo o que está escrito aqui. Assim como também sei, exatamente, tudo o que está escrito em todas as coisas que li desde a minha transformação. Mesmo assim, eu tinha, até então, a certeza de que meu trabalho com as cúpulas estava concluído. Não há mais nenhuma espécie a catalogar. Devo ter errado em algo ou Malberon encontrou algum novo exemplar?



Com o livro aberto, então, caminho em direção ao início do corredor. O rapaz novamente abre o note book, o homem continua esculpindo o pilar. Paro na frente da primeira cúpula. Começo a dedilhar as páginas do livro. E sinto como se dedilhasse as páginas de minha própria vida.


CONTINUA....

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