segunda-feira, 29 de novembro de 2010

O Imortal Kalymor: Interlúdios. Parte 7 da Crônica: A Catedral.



“Dei-lhe um forte abraço! Como um filho faz em agradecimento ao seu pai. Senti suas lágrimas se mesclarem às minhas e inundarem um dos lados de nossas faces. Eu amava aquele velho com uma força incrível. Ainda hoje remôo minha alma quando penso no que poderia ser diferente se eu não tivesse fechado aquela porta.”

Despediu-se de Altair...

“Galhos que se projetavam em direção às plantações, que pareciam braços me chamando para não partir. Observei admirado que, nas raízes da árvore, uma forma humana erguia-se como que por encanto. Havia uma figura, fantasmagórica pelo seu modo de surgir, e bela por sua graciosa forma. Uma menina linda havia se conjurado diante de meus olhos, com cachos negros escorrendo em frente de sua face. Numa respiração profunda, puxou para dentro de si não somente ar, mas com ele toda a vida que antes não tinha. Logo, não mais era uma escultura, mas uma criança. Começou a escalar a árvore, como um fruto que deseja voltar à sua mãe. Lentamente, à medida que fugíamos do chão, seu corpo parecia crescer a cada vez que suas unhas e pés se prendiam nas frestas da madeira. Logo, eu estava rindo como há muito não fazia, pois me dei por conta de já ter feito aquilo antes, com aquela mesma pessoa. Marina estava graciosa, e como num leve e implorado sonho, começamos a subir a árvore como crianças novamente. E os anos que vivemos passavam diante de nós, à medida que subíamos, deixando os galhos que ficavam para baixo como testemunhas de cada época. No final, quando as estações do tempo não mais se apoiavam nos galhos, Marina estava como da última vez em que a vi. Ela mantinha o sorriso nos lábios, e com uma alegria infantil pegou-me pela mão. E surpreendentemente se jogou da árvore. Como bailarinos do espaço, de mãos dadas, iluminados pela lua e tendo o trigo como um imenso tapete, cortávamos o vento na velocidade dos pássaros. E esquecendo completamente da altura, nos amamos, cavalgando as correntes do ar. Talvez Deus tenha tentado se redimir, e a tenha tornado um anjo.”

Despediu-se de Marina? Ou talvez a tenha encontrado para somente se despedir mais uma vez?
“Entrei no corredor de árvores retorcidas que dava acesso à porta da frente da casa de Zacchi. O mago apareceu uns passos adentro. O necromante fitou-me de uma forma que nunca havia feito antes. Olhava para mim quase como se não me conhecesse mais, ou como se fosse a primeira vez que nos víssemos. A lua lancinou de uma absurda intensidade. Não, não era mais a lua, mas o sol, que mostrava seus primeiros raios. Virei meu rosto em sua direção, pois o astro ainda não tinha tanta força para me cegar. Por sobre as densas árvores que compunham os arredores da morada de Zacchi, vi, a silhueta, perfeita, de meus pais. Estavam de mãos dadas, lado a lado. Pareciam seres feitos de porcelana. Bonecas divinas. Uma melancólica imparcialidade eclodia naquela imagem. Com um movimento leve, ambos acenaram para mim, em despedida. Tirando minha atenção daquela imagem, o necromante me chamou. E falou palavras ainda mais estranhas do que tudo o que havia acontecido até então.

_Hans Kalymor! Conseguimos!”

E compreendeu que estava, sim, despedindo-se de sua própria vida...







CONTINUA.... 

Nenhum comentário:

Postar um comentário